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Escândalo Nas Ruas de Beverly Hills

Escândalo Nas Ruas de Beverly Hills

Tudo começou com o conselho do meu amigo Bidú. Ele disse que, uma vez em Los Angeles, eu tinha que conhecer uma lanchonete chamada In-N-Out. Neste ponto da viagem estávamos na Rodeo Drive, local conhecido pelas lojas de grifes caríssimas, lugar de “gente fina”. A Kelly queria conhecer o Beverly Wilshire Hotel (do filme Pretty Woman – Uma Linda Mulher) então depois de andar bem por aque região partimos para a nossa próxima parada, que seria a Praia de Malibu.

Calçada do Beverly Wilshire Hotel
Via Rodeo – Entre Rodeo Dr. e Wilshire Blvd.

Ah, mas o Bidú falou que não podíamos ir embora de L.A. sem conhecer a haburgueria In-N-Out! Então seguimos pela Wilshire Blvd em direção à praia e desviamos a rota na altura de Westwood para a loja que estivesse mais próximo ao nosso caminho. Deveria ser uma rápida parada para o lanche pois queria chegar em Malibu ainda com luz do dia.

Encontrei uma boa vaga para estacionar na Broxton Ave porém bem apertada entre dois carros. Como eu já estava há 10 dias com aquele Mustang alugado, olhei para a vaga e calculei que o carro caberia ali mesmo com um pouco de dificuldade.


Tentei entrar na vaga. Estava difícil. Fui para frente e para trás, tentei encaixar o carro mas não teve jeito. Tive que assumir a derrota e procurar outra vaga. Fiz o movimento para sair. A frente do carro já estava na rua, eu olhando para trás só para ver quando podia começar a andar e… E aí começa nossa história!


A Alcoviteira

Enquanto eu estava no árduo trabalho de tentar encaixar o Mustang naquela vaga apertada, percebi que havia uma senhora parada na calçada observando atentamente cada movimento que eu fazia. Ela chegava a ficar bem perto do carro, observando cada detalhe. A impressão que tínhamos é que ela era uma dessas velhas alcoviteiras e estava ali torcendo para ver uma batida. Cada movimento bem sucedido que eu fazia era uma frustração para ela.

Ela ficou ali, olhando meticulosamente toda a minha manobra, com olhar de recriminação, até o momento que desisti. Chegou a dar para perceber a sensação de felicidade dela ao ver que não fui exitoso em encaixar na vaga. Quando eu estava com o carro pronto para ir embora percebi que ela sumiu. Cada um com seu tipo de prazer. Parece que esse era o dela.

A Japonesa Maluca

Quando eu penso que vou começar a andar para procurar outra vaga olho para frente e tem uma japonesa maluca em pé, à frente do meu carro, gritando histericamente: “stop! stop! stop!” agitando os braços para cima de forma totalmente tresloucada.

Levei um susto e abri a janela para saber o que ela queria. Ela chega do meu lado gritando feito uma louca dizendo “você bateu no meu carro!” e aponta para o SUV branco dela que estaria à frente do meu carro caso eu tivesse conseguido estacionar.

Então eu disse para ela:
– Eu não bati no seu carro, apenas tentei entrar na vaga e não deu.
– Bateu sim! Aquela mulher disse que você bateu! (apontando para a alcoviteira).

E enquanto eu pensava “essa não! Até aqui tem dessas coisas!” ela continuava gritando enlouquecidamente, que eu tinha que pagar o prejuízo dela, que ela iria me processar, e gritava e gritava. Então eu disse para a Kelly:
– Na frente do carro dela tem um carro de polícia, eles não estão vendo isso. Corra lá e chame-os.

Os Competentes Policiais

Parecia cena de filme americano! (faz sentido!) No mesmo instante apareceu aquele belo carro de Polícia. Eles podiam ter vindo a pé, afinal estavam logo ali na frente, mas acho que é para causar impacto mesmo. Vieram com o carro fazendo barulho, pararam o veículo atravessado na pista e bloquearam com cones. Quase que eu falei “precisa disso tudo não, só retirem essa japonesa maluca daqui”.

O primeiro policial foi até ela e perguntou o que estava acontecendo, ela continou gritando, exigindo “seus direitos” de forma histérica, o policial não conseguia entender nada e então o segundo policial veio para mim e perguntou o que havia acontecido.

Após explicar todo o ocorrido ele disse que entendeu mas que havia apenas uma dúvida, que seria crucial para andamento do caso. E a dúvida era se enquanto eu manobrava na tentativa de entrar vaga, em algum momento chegou a encostar o meu carro em um dos carros, mesmo que muito levemente.

Encostou ou Não?

Não sei. Não tem como saber. Expliquei para ele. Muito educadamente ele me disse que já havia olhado no computador e sabia que meu carro era alugado e que pelo meu sotaque sabia que eu era estrangeiro. Ele primeiro exaltou a Califórnia como sendo um belo Estado turístico e que recebia pessoas de todos os lugares o tempo todo. Ele disse que entendia perfeitamente o fato de eu não conhecer as peculiaridades das Leis locais e me explicou sobre um crime chamado “touch and escape” (toque e fuga), que consiste exatamente no fato de um carro encostar no outro, mesmo que não haja qualquer dano, e então foge.

Segundo ele, a japonesa maluca poderia se valer dessa Lei para me incriminar visto que toda a situação do local dava a entender que realmente poderia ter havido o toque de um carro no outro, e o fato de meu carro estar apontado para a rua poderia caracterizar a suposta fuga.

Perícia no Local

Ele me pediu para sair o carro e acompanhá-lo pois ele iria fazer uma inspeção nos parachoques do meu carro e nos parachoques dos carros que estavam à frente e atrás da vaga que eu tentava entrar. Mesmo estando à luz do dia ele utilizou uma lanterna e foi apalpando todos os parachoques e acompanhando com a lanterna conforme combinado.

A japonesa maluca não acompanhou a inspeção porque ainda estava muito desequilibrada gritando com o outro policial no meio da Av. Broxton.

Nenhum dano foi encontrado, nem um arranhão sequer. Eu perguntei a ele “e agora, o que se faz? Paga-se uma multa?” uma vez que não há prejuízo físico para ser pago.

Retratação Pública no Tribunal

Ele me explicou que a penalidade para o crime de “touch and escape” é o pagamento do conserto do veículo atingido e um pedido de desculpas protocolado publicamente no Tribunal de Justiça! Ele concluiu dizendo que, como não havia qualquer dano no carro dela, ela teria o direito de exigir que fôssemos todos para o tribunal para eu fazer esse tipo de documento. Ele riu, disse que também achava isso uma coisa antiquada mas que, infelizmente é a Lei.

E Malibu?

Uma curiosidade sobre a Califórnia é que na época do ano em que eu estava lá, os dias eram super curtos. Começava a escurecer às 17h e por volta de17h30 já era noite. Escuro mesmo. Meu planejamento, naquele ponto da viagem era chegar na Praia de Malibu ainda com luz solar, para apreciar o píer e poder avistar a parte do morro onde é projetada a casa do Tony Stark nos filmes da Marvel.

Para quem não sabe, aquela mansão não existe, ela é toda construída por computação gráfica sobre o terreno existente. De verdade mesmo, só o local vazio.

Acontece que, com todo esse imbróglio eu iria perder essa parte do passeio. Imagina ter que sair dali, ir para o tribunal, aguardar atendimento e realizar todos os trâmites necessários.

Policial Psicólogo e Policial Engenheiro

Sempre muito simpático comigo e diante da minha situação de horário de passeio comprometido, o policial que me atendia disse:
– Não se preocupe. Nós entendemos que você é um turista prestigiando o nosso amado Estado da Califórnia. Nós faremos tudo o que está ao nosso alcance para não atrapalhar seu passeio. Nós já vimos que nada aconteceu e que aquela mulher está querendo apenas se dar bem com toda essa situação. Infelizmente isso tem acontecido muito por aqui.

E ele continuou:
– Mas fique tranquilo porque o meu colega que está lá tentando acalmá-la é muito hábil em resolver esse tipo de problema. Ele é formado em psicologia pela UCLA.
– O seu colega é psicólogo?!!!
– Sim, e eu sou engenheiro.

Aquele momento em que bate um complexo de vira-lata e você faz uma associação ao policial padrão do seu país… Contudo, o que mais me chamou a atenção nem foi a formação deles, mas sim a gentileza, educação e cordialidade com a qual eles estavam me atendendo.

O Bebê Chorou

E, por incrível que pareça, ele já estava obtendo sucesso! A japonesa maluca já estava se acalmando, ele fez a inspeção novamente, mostrou para ela pela terceira vez que não houve qualquer dano, que seria uma grande perda de tempo irmos para o tribunal. E começou até mesmo a fazer ameaças do tipo, imagina se o juiz te mandar pagar alguma coisa ao turista pelo transtorno causado… Tudo ia bem até que a alcoviteira grita lá do outro lado: “o bebê está chorando!”.

A japonesa maluca corre para a porta de trás do carro dela, encontra o bebê chorando e começa toda a palhaçada novamente:
– O bebê está chorando porque ele bateu no meu carro! Eu quero chamar uma ambulância, eu quero ir para o hospital agora!

Enquanto ela voltava a gritar e gesticular histericamente o policial psicólogo foi até o bebê, ficou brincando com ele até acalmá-lo enquanto o policial engenheiro começou todo o procedimento de acalmar a mulher novamente. Passados alguns minutos o bebê parou de chorar, a mulher se acalmou e então um dos dois disse para ela de forma enérgica que eles já haviam percebido a má intenção dela, que isso seria dito no tribunal e recomendaram que ela se retirasse. Finalmente ela parou de fazer sua cena e se retirou.

A Dona da Loja

Quando tudo parecia estar resolvido, vem uma mulher correndo em nossa direção, acompanhada da alcoviteira. Ela veio desesperada perguntando aos policiais “bateram no meu carro? Essa mulher foi lá na minha loja dizer que bateram no meu carro!”.

O policial deu um tapa na própia testa e disse “oh, my god!” (que nesse contexto poderia ser traduzido para “PQP!”). Ele então acalmou a mulher, disse que nada aconteceu, pegou a lanterna e fez a inspeção do parachoque vermelho do carro dela. Ela acompanhou com cuidado e agradeceu a atenção dos policiais.

O Pedido Inusitado

Em ato contínuo o policial se vira para ela e diz:
– A senhora não é a dona da loja xyz?
– Sou eu mesmo (toda feliz por ser reconhecida!)
– Então… O nosso amigo aqui é turista e está aqui prestigiando nosso Estado da Califórnia. Ele já sofreu muito por conta desse incidente e eu gostaria de lhe fazer um pedido para que ele tenha uma boa impressão do nosso Estado.
– Pois não, o que é?
– A senhora poderia ceder a sua vaga para ele estacionar o carro? Tem muitas vagas no estacionamento público ao lado da sua loja. Eu acabei de vir de lá.

Para minha total perplexidade, ela muito getilmente disse para o policial “é claro! O que nós não fazemos para causar uma boa impressão para nossos turistas?”. Ela então entrou em seu SUV vermelho e liberou a vaga. O policial disse “pronto. Agora você tem uma boa vaga para estacionar seu carro”. Totalmente atônito, sem acreditar no que estava acontecendo, entrei no carro e estacionei na vaga agora liberada!


A Vaga Irregular

Depois que já estava estacionado em segurança, o policial, ainda de forma muito gentil, me deu uma notícia assustadora. Ele apontou para a vaga que eu tentava entrar e me disse:
– Está vendo que a guia (meio-fio) naquele local está pintada de vermelho?
– Sim (falei por educação porque de dentro do carro não dava para ver a guia).
– Então, aquilo é um indicativo de fire lane (faixa de incêndio). Se você tivesse estacionado ali, seria multado, estou lhe explicando porque você é de fora e tem todo o direito de não saber todos os detalhes das nossas regras.
– Muito obrigado. Vou tomar cuidado com isso.

O Preço Disso Tudo

Diante da atuação dos dois policiais e acostumado aos moldes de funcionamento da nossa Polícia no Brasil. Fiquei sem reação, realmente sem saber o que fazer. Em nosa cultura, se o policial faz algo dentro do padrão a gente oferece um “guaraná” para ele. Se ele excede as expectativas, uma latinha de guaraná já não resolve mais, a coisa sobe para duas, três latinhas. Então veio o caso do pedido de liberação da vaga ocupada pelo carro vermelho, aí eu comecei a ficar desesperado pensando “agora vai um caminhão de guaraná”. No final quando ele ainda falou da fire lane pensei “pronto! Me lasquei! Vou sair falido daqui, esse camarada vai querer que monte uma fábrica de guaraná para ele!!!”.

Por outro lado é famosa a história que policiais estadunidenses, ao contrário dos nossos, não aceitam guaraná em hipótese alguma, que isso é considerado por eles como uma grave ofensa. E agora? Como sair dessa?

De forma muito cuidadosa eu me dirigi a ele e disse algo do tipo:
– Sou muito agradecido por tudo o que você e seu colega fizeram por mim, realmente eu nunca vi um atendimento de tamanha excelência por parte da Polícia. Em meu país, quando o policial excede suas funções, da forma que vocês fizeram, é comum nós expressarmos nosso agradecimento em forma de uma pequena gratificação financeira. Por outro lado eu sei que aqui a prática é diferente mas, como você sabe, sou estrangeiro, e não sei exatamente o que fazer para lhe agradecer. Eu vou deixar que você me diga como eu devo lhe fazer esse agradecimento e lhe garanto com a minha palavra que isso ficará entre nós.

E agora se preparem psicologicamente para a resposta que me foi dada:
– Eu aqui falo em nome do Estado da Califórnia e eu quero saber uma coisa.
– Pois não?
– Você está feliz com o atendimento que lhe foi prestado pelo Estado da Califórnia?
– Sim, estou muito.
– Você vai recomendar o Estado da Califórnia como destino turístico para outras pessoas quando regressar a seu país?
– Sim, com toda a certeza.
– Então esse é o meu agradecimento. Saber que sua visita ao nosso amado Estado não ficou frustrada por causa de um incidente no trânsito.
– Tenha certeza que estou muito feliz com minha visita. Pretendo voltar mais vezes a este belo Estado e vou recomendar as todas as pessoas quando estiver de volta a meu país!

Polícia da Califórnia


Prosseguindo a Viagem

Enquanto eu agradecia e fechava o carro para, finalmente ir comer o hambúrguer da In-N-Out rolou mais alguma conversa do tipo:
– De onde você é?
– Sou do Rio de Janeiro, Brasil.
– Ah, Rio de Janeiro! É verdade que lá existem lindas mulheres?
– Meu amigo, vou lhe contar um segredo, estou há 10 dias viajando por aqui e posso lhe garantir uma coisa: em 5 minutos caminhando pelo meu bairro você vê mais mulheres bonitas do que nesses 10 dias rodando toda a Califórnia!
– Wow! Que legal! Eu preciso conhecer esse lugar!
– Precisa sim, depois que você conhecer o Rio nunca mais vai querer voltar para cá!
(risos de todos)
– Tudo bem, nós vamos embora, não queremos tomar ainda mais o seu tempo de viagem. Sei que você e sua filha querem passear por aqui.
– Ela não é minha filha, é minha esposa!
(mais risos e despedida).

Dali fui para a hamburgueria e descobri que é um ponto de encontro dos policiais, o local estava lotado deles, então pedi para fotografar com um para guardar de recordação nesse inusitado momento.

Para minha raiva, nem gostei tanto assim do sanduíche! De lá fomos para Malibu mas, com todo esse atraso, quando lá chegamos já estava anoitecendo. Só deu para fazer umas fotos e continuar a longa viagem em direção San Francisco.

Píer de Malibu – Às 17h40m

E quando eu digo que lá escurece muito cedo, não estou exagerando. Quando chegamos ao píer de Malibu já era noite. E ainda era 17h30.

O fato ocorreu no dia 9 de novembro de 2013 como parte de uma visita de 15 dias ao Estado da Califórnia, época do ano que sempre faço viagens mais extensas.

Achou louca a história? Deixe seu comentário aí embaixo!

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6 thoughts on “Escândalo Nas Ruas de Beverly Hills

  1. Adorei a parte da indicação do Estado da Califórnia e achei o máximo a cordialidade e educação deles. É essa a parte bonita que vejo no povo americano que sempre enxerguei.

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